segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O ENIGMA CHILENO

Muitos leitores estarão se perguntando por que Chile, sob o comando de uma presidente socialista teve, neste primeiro turno, uma inclinação em direção da direita pinochetista, liderada pelo candidato Sebastião Piñera. Vou fazer um intento de entender tal paradigma histórico. Apesar dos claros avanços focalizados em políticas públicas do governo Bachelet, ainda persiste no Chile uma extrema desigualdade social. Num país no qual o sistema impositivo, claramente recessivo, com um imposto de renda tão baixo, que faz com que os ricos praticamente não paguem impostos, termina se refletindo no inconformismo de uma classe média empobrecida, não tão pobre, mas sufocada por um custo de vida alto e poucos benefícios. Por ser um sistema totalmente privatizado, o sofrimento desta classe é ainda maior: universidade cara e tarifas insuportáveis. Se o modelo de centro-esquerda não conseguiu eliminar tais problemas, a esperança se direciona num candidato de direita que promete resolvê-los. Tal a razão da incapacidade da presidente Bachelet de transferir votos para seu sucessor.
Apesar das políticas públicas destes últimos vinte anos de governo de concertação, a essência do modelo continua sendo a mesma, centrado num nível de mercantilização criminoso da economia e da sociedade. Por que então um candidato de direita vitorioso no primeiro turno? Não existe o mínimo de desconfiança por parte da população dele continuar reforçando tal política? Para responder este questionamento, vamos analisar alguns dados das eleições presidenciais do dia 13 de dezembro passado. Dos mais de 12 milhões de cidadãos de 18 anos habilitados a votar, somente se apresentaram 6.539.570 pessoas. Desse total, 8 milhões estão inscritos nos registros eleitorais. Entretanto, mais de um milhão nem sequer se apresentaram às respectivas mesas de votação. 200 mil pessoas anularam seu voto e mais de 80 mil votaram em branco. Isto é, 47% dos potenciais eleitores em idade de votar não participaram. Isso mostra uma crise de representatividade na manutenção do modelo atual. Não se trata de criminalizar o atual governo, que tantas melhorias conseguiu combatendo a pobreza, como forma de atenuar as diferenças sociais. Porém, tudo aquilo que se perpetua, como a concentração da propriedade, por um lado, e a desigualdade em todos os níveis, por outro, são os resultados que melhor caracterizam tal governo. Tal situação tornou-se crítica perante a crise mundial, que atingiu diretamente a economia e a barriga do povo. O modelo chileno, assentado num formidável impulso exportador em produtos primários, no qual 40% destes continua sendo o cobre, dificulta a ampliação dos benefícios do crescimento a todos os setores sociais, expondo a economia aos ciclos externos recessivos, debilitando-a. O povo chileno terá a oportunidade de resolver tal enigma no segundo turno, no próximo dia 17 de janeiro de 2010.
Victor Alberto Danich - Sociólogo

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